Tudo sobre a Calvície
Hoje, trouxemos para você, uma entrevista feita pelo Dr Drauzio Varella ao médico e professor de Dermatologia no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, Dr. Luiz Carlos Cuce, na íntegra. A entrevista foi realizada em 2011 e revisada recentemente (https://drauziovarella.com.br/entrevistas-2/calvicie-2/).
Das informações contidas na entrevista, nos chamou a atenção, as questões da calvície nas mulheres e os tratamentos.
Leia e informe-se sobre a calvície!
A calvície é um problema que afeta especialmente os homens, pois a testosterona, hormônio sexual masculino, é a maior responsável pela queda do cabelo. Embora as mulheres também a produzam, nelas a quantidade é muito menor.
Ao atingir a raiz do cabelo, a testosterona sofre a ação de uma enzima. Como consequência dessa reação, surgem substâncias que vão reduzir a velocidade de multiplicação das células da raiz ou mesmo provocar a morte delas. O resultado é que o cabelo fica mais fino e seu crescimento mais vagaroso.
Em outras palavras: a raiz do cabelo, ou bulbo capilar, localiza-se num meio bioquímico nutritivo para que as células se multipliquem e formem uma haste que vai aumentando de tamanho. Essas células vão se renovando de baixo para cima e morrem na ponta do fio. Os cabelos, depois de certo tempo, caem e são substituídos por outros, num processo de renovação permanente. Nos casos de calvície, porém, há uma atrofia dos bulbos capilares e não crescem novos fios.
FISIOLOGIA DO CABELO
Drauzio – Como é a fisiologia do cabelo?
Luiz Carlos Cuce – O cabelo tem um período de crescimento chamado de fase de anagênese que dura mais ou menos um mês e varia de indivíduo para indivíduo de acordo com suas características genéticas e etnia. Depois, entra num período de estase e, a seguir, num período de involução bastante rápido conhecido por catálise em que o pelo acaba se soltando e caindo. Por exemplo, o cabelo loiro e fino cresce de forma diferente do cabelo mais duro e de crescimento mais lento das pessoas negras. De qualquer forma, a duração de um fio de cabelo, do nascimento até a queda, é ao redor de um ano e meio ou dois anos.
Drauzio – Quer dizer que no decorrer da vida renovamos o cabelo várias vezes?
Luiz Carlos Cuce – Renovamos várias vezes. O interessante é que, quando jovens, perdemos em torno de 100 a 150 fios por dia, o que confunde muita gente, porque os livros dizem que isso é normal. Então, as pessoas com queda de cabelo se põem a contar os fios que caem e acreditam estar na faixa de normalidade, o que nem sempre é verdade.
Por outro lado, com o passar dos anos, o número de cabelos tende a diminuir. Mesmo os mais cabeludos confessam que, na juventude, tinham cabeleira muito mais farta.
Drauzio – Você disse que tem gente que conta os fios que caem?
Luiz Carlos Cuce – Não só contam os fios, como procuram o médico com os cabelos dentro de uma caixa para mostrar que eles caem com a raiz, no que estão certos. Fazem isso porque, apesar de alguns profissionais terem dito que essa queda é normal, estão apavorados, imaginando que por toda a vida irão perder diariamente a mesma quantidade de fios o que evidentemente é um engano, porque a perda não é uniforme ao longo da vida.
FAIXA ETÁRIA PERIGOSA
Drauzio – Qual a idade mais perigosa para a calvície instalar-se?
Luiz Carlos Cuce – Dezessete anos é a idade mais perigosa para a calvície começar a instalar-se definitivamente. Essas pessoas, por razões genéticas e hormonais, aos 22-23 anos já estão carecas. Aquelas que vão perdendo os cabelos mais devagar a partir dos 25-26 anos podem contar com melhores resultados no tratamento, porque nelas a participação da hereditariedade é menor.
A genética pode manifestar-se sob dois diferentes aspectos: um, em que o gene provoca a queda permanente do cabelo e outro, em que o gene produz excesso de oleosidade, causa da dermatite seborreica que também derruba os cabelos, embora eles caiam em menor quantidade e mais lentamente.
Os hormônios androgenéticos, isto é, os hormônios masculinos, entre eles a testosterona, agem não só diminuindo a produção dos pelos e inibindo a proliferação das células formadoras da haste capilar, mas também na glândula sebácea anexa ao pelo, aumentando a oleosidade. Por isso, quase 90% dos carecas têm pele e couro cabeludo oleosos. Em geral, eles perdem os cabelos mais tardiamente, por volta dos 25 anos, e devem tratar a dermatite para controlar a queda.
TIPOS DE CALVÍCIE
Drauzio – Algumas pessoas perdem os cabelos por igual, na cabeça inteira; outras ficam com aquela tonsura de padre ou com entradas. Quais são os casos mais comuns?
Luiz Carlos Cuce – Eu diria que a velocidade da perda é diferente num e noutro caso. Alguns progridem para a calvície tão rapidamente que nem percebem por onde ela começou. Na verdade, o cabelo sempre começa a cair pelas entradas, porque isso é genético. Se você comparar pais e filhos homens, é claro, verá que as entradas são muito semelhantes e que a queda evolui atingindo o vértice do couro cabeludo e formando a carequinha de padre. Daí em diante, a rarefação se espalha e a calvície toma conta de toda a parte superior da cabeça, sobrando apenas o cabelo das áreas laterais. Por isso, é que se brinca que os paralamas sempre ficam, o que some é a capota.
Drauzio – Por que as áreas laterais resistem e a área central não?
Luiz Carlos Cuce – Isso acontece porque os fatores genéticos para a calvície não atuam nas áreas laterais da cabeça. Baseando-se nessa característica, os cirurgiões plásticos e dermatológicos fazem a cirurgia de implante. Retiram da parte posterior da cabeça faixas de cabelo, cortam os cabelos de modo a retirar-lhes os folículos pilosos e os implantam na área rarefeita do couro cabeludo. Esses cabelos, normalmente, não caem mais.
CALVÍCIE NAS MULHERES
Drauzio – Tradicionalmente, os homens sempre perderam cabelo, mas com as mulheres raramente isso acontecia. Hoje é mais frequente encontrar mulheres com alopecia (calvície) ou simplesmente estamos mais atentos para o problema?
Luiz Carlos Cuce – De fato, os casos de alopecia feminina são mais frequentes atualmente. Atribuo essa maior incidência à tensão emocional a que estão expostas as mulheres no momento. Por mecanismos diversos, entre eles o hormonal, o aumento da oleosidade favorece a queda dos cabelos nas pessoas muito tensas e ansiosas. Enquanto as mulheres viveram mais tranquilas em casa, desobrigadas de assumir encargos de trabalho dentro e fora do lar, a tendência à alopecia era mais rara. Hoje, o papel que a mulher desempenha na sociedade tornou-a mais susceptível ao estresse e à ansiedade e perder cabelos virou realidade também para elas.
Outro fator que pesa é o padrão estético associado à mulher muito magra, um palito. Para atingir esse ideal, muitas fazem regimes por conta própria ou seguem as orientações de vizinhas, sem respeitar uma dieta balanceada prescrita por especialistas. Isso leva à carência nutritiva e à anemia que provocam enfraquecimento e queda dos cabelos. Além disso, as manipulações a que se submetem nos institutos de beleza também danificam os cabelos. O alisamento, especialmente o alisamento japonês que emprega calor, tração e substâncias químicas, provoca queda capilar. A escova quente, se feita todos os dias, também é prejudicial. Isso para não falar de outros produtos, como tinturas, fixadores, laquês e condicionadores. Às vezes, ocorrem verdadeiros contrassensos: as mulheres lavam os cabelos para retirar o excesso de gordura e em seguida passam uma substância oleosa para desembaraçá-los melhor.
Drauzio – Será isso uma guerra perdida já que faz parte do espírito feminino cuidar mais da aparência física?
Luiz Carlos Cuce – Às vezes, consigo convencê-las a tomar algumas providências. O primeiro conselho é cortar os cabelos mais curtos, porque isso favorece o desembaraçamento e diminui a queda dos bulbos. Algumas mulheres saem do consultório chorando, rasgam a receita e jogam fora. Outras atendem o pedido, cortam os cabelos por uns tempos sabendo que depois poderão deixá-los crescer novamente.
Na verdade, o importante é evitar o fator traumático. Repare no que acontece com as bailarinas ou com as pessoas de pele escura que alisam os cabelos e os puxam para trás, num rabo-de-cavalo ou coque muito tracionado. Na margem do couro cabeludo, essas pessoas vão desenvolvendo áreas de alopecia.
USO DE BONÉS
Drauzio – E o uso de bonés apertados tem algum inconveniente?
Luiz Carlos Cuce – O melhor é evitar o uso do boné que abafa e esquenta a cabeça. Quem o usa com frequência repete o erro das pessoas que lavam o cabelo para tirar a oleosidade e depois passam secador quente, o que faz a gordura reaparecer. Quanto menos calor, melhor para os cabelos oleosos.
Infelizmente, tornou-se um hábito da juventude atual usar boné, o que é prejudicial tanto no sentido da tração do couro cabeludo quanto no da produção de calor o que prejudica os tecidos dessa região.
ALOPECIA AREATA
Drauzio – Você poderia explicar sumariamente as causas da alopecia areata, ou seja, dessas áreas de perda localizada de cabelo ou de episódios de queda total dos cabelos?
Luiz Carlos Cuce – Durante muito tempo, considerava-se que infecções eram a causa da alopecia areata. Hoje, está estabelecido que ela é um problema autoimune e resulta da tensão emocional. Nosso sistema nervoso comanda todas as reações de nosso organismo. A literatura registra casos típicos de crianças cujos pais se separaram e que desenvolveram casos muito graves dessa patologia.
A alopecia areata pode manifestar-se em múltiplas regiões da cabeça. Desde que não apareça na linha própria do implante, é possível recuperar a zona afetada. Caso contrário, fica difícil resolver a situação.
O tratamento é à base de corticoides de uso tópico, psicoterapia, um pouco de rubefacientes locais, isto é, substâncias que excitam a circulação local, deixam a pele vermelha. Pode-se atritar a região química ou fisicamente com gelo seco ou borrifar nitrogênio líquido. Qualquer medida que ajude a aumentar a irrigação nessa área da cabeça é bem indicada.
Drauzio – Por que, quando na linha do implante, os resultados não são os mesmos?
Luiz Carlos Cuce – Ainda não existe uma explicação convincente, mas sabe-se que o prognóstico é muito pior nessa região. O mesmo acontece com a queda total do cabelo. Às vezes, conseguimos uma reponta completa do pêlo. No entanto, se ele voltar a cair, dificilmente nascerá de novo. Isso é comum nos casos de indivíduos que tomam corticoides. Hoje, existe mania de prescrever cortisona em altas doses. Terminado o primeiro ciclo de medicação, se não for ministrada uma dose de manutenção durante longo período, a queda de cabelos poderá ser tão expressiva que dificilmente se conseguirá repô-los. É preciso, por isso, avisar o paciente dos inconvenientes desses remédios nos casos de alopecia, estrias, atrofia da pele, vasos dilatados, ectasias, varizes superficiais, etc.
TRATAMENTO DA CALVÍCIE
Drauzio – Você disse que algumas pessoas nascem com uma carga genética que favorece a queda dos cabelos numa idade muito precoce. Noutras, o processo caminha mais devagar. Como respondem ao tratamento esses dois grupos?
Luiz Carlos Cuce – Se a impressão genética é forte no sentido de favorecer uma queda precoce, as medicações existentes no mercado devem ser tomadas por longos períodos com pequenos intervalos entre eles, porque parou, o cabelo torna a cair. Mesmo os que têm queda menos intensa, devem tomar a medicação por muito tempo. No entanto, as doses podem ser menores e os intervalos de descanso maiores. Quando o peso da carga genética é alto, geralmente se consegue retardar o processo, mas não se consegue obter a cura total.
Drauzio – Quais são os medicamentos que podem ser indicados para quem tem queda de cabelos?
Luiz Carlos Cuce – O mais conhecido é o Minoxidil, um vasodilatador de uso local com ação sobre os receptores androgênicos do pelo, ou seja, que ajuda a bloquear os derivados da testosterona. Se a queda for acentuada, pode-se prescrever a versão mais concentrada, já que existem dois tipos de preparação: um mais concentrado e outro menos.
É preciso tomar cuidado, porque nem tudo o que apresenta bons resultados para os homens pode ser indicado para as mulheres, uma vez que nelas os efeitos colaterais podem ser desagradáveis. Depois de passar o remédio no couro cabeludo, algumas desenvolveram barba na face e pelos nos braços, pernas, etc.
Drauzio – Os homens podem usar sem problema a versão mais concentrada?
Luiz Carlos Cuce – Não podem. É preciso ir tateando a reação de cada um. Sempre é bom começar com uma concentração de 2% ou 3% e ir aumentando gradativamente. Os homens também não devem usar hormônios. Já vi casos desastrosos de indivíduos que usaram estrógeno e progesterona diluídos em loções ou álcool e desenvolveram sinais femininos importantes. O crescimento da mama, por exemplo, requer intervenção cirúrgica para retirar as glândulas mamárias hipertrofiadas, uma vez que elas não regridem mais depois de suspenso o tratamento.
Já conheci gente desesperada, porque está perdendo cabelo e é capaz de loucuras para corrigir esse mal. Tudo tem que ser feito com parcimônia e cuidado. Existem profissionais não habilitados para atuar nessa área que cometem alguns erros crassos.
Drauzio – Qual sua experiência com a finasterida, medicamento indicado para homens por via oral?
Luiz Carlos Cuce – Em termos de resultados, pode-se dizer que se consegue a longo prazo de 20% a 30%, no máximo, de crescimento de cabelo e que 40% não responde absolutamente à finasterida. Se a impressão genética for forte, o tratamento precisa ser mantido por toda a vida com doses terapêuticas iguais desde o início e curtos intervalos de repouso a partir de um ano de medicação. Indivíduos com menor influência genética devem tomar o remédio por um ano, um ano e meio. Em seguida, as doses passam a ser menores e mais distanciadas no tempo.
Para as mulheres existe, ainda, a flutamida que apresenta excelentes resultados para a queda de cabelo feminino, mas seu uso precisa ser controlado para acompanhar os efeitos colaterais. Elas podem também usar hormônios por via oral ou diluídos em loção e aplicados na área afetada pela alopecia.